Uma decisão controversa de um prefeito japonês resultou na construção de uma comporta que ninguém queria, mas que acabou salvando sua cidade de uma grande tragédia
Por décadas, Kotoku Wamura foi alvo de críticas por insistir na construção de uma grande comporta para proteger Fudai, uma pequena vila no Japão com pouco mais de 3.000 moradores. Como prefeito, ele defendeu um projeto que custou ¥ 3,56 bilhões (aproximadamente US$ 30 milhões em 2011) e levou mais de uma década para ser concluído.
Muitos consideraram a obra um desperdício. Mas, em 2011, quando um terremoto de magnitude 9,1 gerou um tsunami devastador, a vila foi poupada. A onda destruiu diversas cidades ao longo da costa japonesa. Mas Fudai permaneceu intacta.
“De qualquer forma que você olhe, a eficácia da comporta e do muro de contenção foi realmente impressionante”, declarou o então prefeito de Fudai, Hiroshi Fukawatari, em 2011.
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Uma vida de determinação do prefeito de Fudai
Kotoku Wamura teve uma carreira política de mais de 40 anos, sendo eleito prefeito dez vezes consecutivas. Ele liderou Fudai por um período de crescimento, mas sempre esteve atento aos perigos do mar.
Nascido em 1909, Wamura testemunhou o tsunami de 1933, que atingiu 28,7 metros de altura e devastou sua vila. Ele também conhecia os relatos do tsunami de 1896, ainda pior. Em ambos os casos, centenas de moradores de Fudai faleceram.
“Quando vi corpos sendo desenterrados das pilhas de terra, não sabia o que dizer. Não tinha palavras”, escreveu Wamura em seu livro “A 40-Year Fight Against Poverty”.
Desde criança, ele ouviu histórias de anciãos sobre tsunamis do ado. Alguns contavam sobre uma pedra no alto de uma colina que marcava o nível da água durante um desastre anterior.
Para ele, isso era um aviso claro de que um grande tsunami voltaria a atingir a vila. Seu objetivo era garantir que, quando isso acontecesse, Fudai estivesse protegida.
A obra da comporta
Em 1967, Wamura conseguiu apoio para erguer um paredão de 51 pés (15,5 metros) no porto de pesca da vila. A altura parecia exagerada para alguns, mas acabou sendo aceita.
O projeto mais ambicioso, no entanto, era uma comporta da mesma altura na enseada onde a maioria dos moradores vivia. Construir uma estrutura desse porte era um grande desafio, tanto financeiramente quanto logisticamente.
Para uma comunidade pequena, investir uma quantia tão alta em uma obra cuja eficácia poderia nunca ser testada parecia um risco desnecessário. Mas Wamura estava convicto. Ele sabia do poder destrutivo do mar.
As autoridades locais sugeriram uma comporta menor, de 20 pés (6 metros), depois 30 pés (9 metros), e então 35 pés (10,5 metros). Wamura rejeitou todas essas propostas. Para ele, somente uma estrutura de 51 pés poderia garantir segurança.
Em 1972, a construção começou, mas a resistência ao projeto permaneceu. Durante os 12 anos de obras, a comporta foi ridicularizada. Muitos consideravam o projeto um exagero e um desperdício. Wamura, no entanto, não recuou. Em 1984, a obra foi concluída, e três anos depois ele se aposentou da política.
Ao deixar o cargo, Wamura fez um discurso simples: “Mesmo se você encontrar oposição, tenha convicção e termine o que começou. No final, as pessoas entenderão.”
Ele faleceu em 1998, sem ver sua obra testada. Muitos ainda o criticavam. Mas em 2011, tudo mudou.
O desastre natural de 2011
O Japão é um dos países mais preparados para terremotos. A nação está localizada em uma área de intensa atividade sísmica, e grandes terremotos são comuns.
Mas o tremor de 2011 superou todas as previsões. Foi um desastre triplo: primeiro o terremoto, depois o tsunami e, por fim, a crise nuclear na usina de Fukushima.
Fudai estava no caminho das ondas. A força do tsunami derrubou árvores, destruiu casas próximas ao litoral e arrastou barcos. No entanto, quando o alarme foi dado, os trabalhadores acionaram o sistema remoto da comporta.
Os enormes painéis de aço se fecharam, isolando a vila da destruição. Um bombeiro precisou até fechar manualmente um emperrado.
O tsunami atingiu a vila, mas parou na comporta. Atrás dela, Fudai estava segura. Nenhuma casa sofreu danos significativos. Somente uma vida foi perdida: uma pessoa que saiu para verificar seu barco no porto, fora da proteção do muro.
O legado de Wamura
Após o desastre, moradores aram a visitar o túmulo de Wamura para prestar homenagens. Antes ridicularizado, ele agora era reconhecido como o homem que salvou a vila.
Anos depois de sua morte, sua convicção se mostrou correta. Ele insistiu em uma proteção que muitos consideraram exagerada. Mas, quando o pior aconteceu, sua decisão salvou centenas de vidas.
O legado de Kotoku Wamura é um exemplo de como a visão e a determinação podem superar o ceticismo. Sua comporta permanece como um símbolo de planejamento cuidadoso e da importância de aprender com a história para evitar tragédias futuras.
Com informações de ZME Sciense.