Pacote de R$ 19 bilhões anunciado por Ricardo Nunes resgata obras antigas, agita bastidores políticos e reforça ambição de protagonismo em São Paulo.
Prefeito de São Paulo volta a anunciar construções já prometidas por gestões anteriores, agora em um novo programa bilionário
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), anunciou um novo pacote de obras com investimento estimado em R$ 19 bilhões para a capital paulista.
Ao todo, 55 intervenções urbanas foram incluídas no programa, muitas delas reaproveitadas de gestões adas ou já anunciadas anteriormente pelo próprio Nunes.
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Segundo o prefeito, trata-se de um esforço de continuidade e de estruturação da cidade, embora diversas das obras ainda estejam em estágios iniciais, como licitação ou elaboração de projeto.
Programa resgata obras antigas com roupagem nova
Entre os projetos anunciados estão o BRT Radial Leste e a extensão da avenida Roberto Marinho — duas iniciativas que já foram alvo de promessas anteriores.
O corredor de ônibus na zona leste, por exemplo, foi prometido por Nunes durante seu primeiro mandato e reapresentado como prioridade nos cem primeiros dias de governo, em 2021.
No caso da avenida Roberto Marinho, a proposta de estender a via até a rodovia dos Imigrantes remonta a 2009, ainda na gestão de Gilberto Kassab (PSD), que governou São Paulo entre 2006 e 2012.
Apesar da repetição dos projetos, Ricardo Nunes nega que esteja apenas reembalando planos antigos.
“São obras estruturantes, de médio e longo prazo, que fazem parte de um ciclo que iniciamos e que, em alguns casos, precisaram ser interrompidas por questões judiciais ou istrativas”, argumentou o prefeito em coletiva.
Obras em diferentes estágios e prazos estendidos
Nem todas as obras têm cronogramas definidos ou previsão de entrega próxima.
Algumas intervenções devem ultraar o ano de 2028 para serem finalizadas.
É o caso do terminal Itaim Paulista, na zona leste, que ainda se encontra na fase de projeto.
Já a ligação entre as avenidas Graúna e Gaivotas, na região sul da cidade, está em processo de licitação.
A fragmentação dos estágios das obras levanta dúvidas sobre a real capacidade de execução dentro da atual gestão.
Mesmo assim, o prefeito demonstrou otimismo.
“Está tudo dentro do meu prazo. Estou bastante feliz com a quantidade de entregas que teremos ao completar os cem dias”, declarou.
Entregas aceleradas em meio a especulações eleitorais
O anúncio do novo pacote ocorre em um momento em que Ricardo Nunes vem intensificando a entrega de obras e projetos.
Na mesma data do lançamento do programa, o prefeito inaugurou o CEU Rei Pelé, na Cidade Líder, zona leste, que atenderá quase dois mil alunos.
Essa foi a primeira unidade entregue por sua gestão, embora o plano de metas 2021-2024 previsse a entrega de 12 CEUs ao longo do período.
Até então, nenhuma dessas unidades havia sido entregue.
A aceleração nas entregas reacendeu especulações sobre uma possível candidatura de Nunes ao governo do estado em 2026.
Nos bastidores, aliados do prefeito indicam que ele vem articulando sua projeção política para a disputa.
Em resposta, o prefeito afirmou que o programa não tem qualquer relação com o cenário eleitoral.
“Não tem absolutamente nada a ver com 2026. São apenas gestões com estilos semelhantes. Cada um tem seu jeito de governar”, disse.
Comparações com o governo estadual e referência histórica
Na semana anterior ao anúncio de Nunes, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também apresentou um extenso pacote de obras.
Tarcísio é apontado como o nome mais forte para disputar a Presidência da República em 2026, no lugar de Jair Bolsonaro (PL), que está inelegível.
A coincidência de agendas entre os dois gestores gerou comparações políticas e suspeitas de movimentações estratégicas.
Nunes, no entanto, rejeitou qualquer associação.
“O programa do Tarcísio é mais amplo, mas segue o estilo dele de gestão, com responsabilidade fiscal e investimentos estruturantes”, declarou.
Como inspiração para o atual projeto, o prefeito mencionou o ex-prefeito Prestes Maia, que governou São Paulo na década de 1930.
O novo programa foi batizado com referência ao livro “Os Melhoramentos de São Paulo”, de 1938, que retrata as transformações urbanísticas da época.
“Naquele tempo, não existia o PSOL para atrapalhar. Prestes Maia teve sorte. Ainda bem que hoje eles são minoria”, ironizou Nunes durante o anúncio.
Entregas incompletas nos cem primeiros dias
Desde o início de sua gestão, Ricardo Nunes enfrenta críticas pela baixa execução das metas estipuladas.
No plano de cem primeiros dias, o prefeito cumpriu apenas 15 das 43 metas apresentadas inicialmente, conforme apuração do UOL.
Muitas dessas metas, inclusive, já haviam sido recicladas do plano de metas da cidade para o período de 2021 a 2024.
Entre as promessas não cumpridas está a inauguração da Casa de Cultura Cidade Ademar, na zona sul.
Segundo Nunes, o atraso se deve à falta de ligação da energia elétrica no local, responsabilidade que ele atribui a terceiros.
“Não deixamos nada a desejar. Existem apenas ajustes de prazos, que são normais em obras públicas. Mas estou satisfeito com o que foi entregue”, afirmou.
Segurança pública ganha protagonismo inesperado
Apesar da ênfase em obras estruturantes, uma das ações mais visíveis da gestão recente de Nunes foi na área de segurança.
Em fevereiro, a prefeitura inaugurou um digital que exibe em tempo real o número de prisões realizadas por meio do sistema Smart Sampa, que integra monitoramento com câmeras inteligentes.
Essa iniciativa, inclusive, não estava prevista entre as metas prioritárias da istração municipal.
Ainda assim, tornou-se uma das vitrines da gestão, com grande apelo popular e forte visibilidade midiática.
A medida foi interpretada por aliados como parte da estratégia de fortalecimento da imagem de Nunes frente a uma possível disputa majoritária.
Projeto ambicioso entre promessas antigas e novos desafios
O novo pacote de obras lançado por Ricardo Nunes reforça a tentativa do prefeito de consolidar sua gestão com entregas de grande impacto.
No entanto, a sobreposição de projetos antigos, a baixa execução de metas anteriores e o uso político do anúncio levantam dúvidas sobre a real efetividade do plano.
Com obras em diferentes estágios e prazos estendidos até além de 2028, caberá à próxima gestão — ou gestões — a responsabilidade de dar continuidade a boa parte dos projetos.
Se bem executado, o plano poderá remodelar áreas importantes da cidade.
Caso contrário, pode apenas reforçar a crítica de que a iniciativa se trata de uma reedição de promessas não cumpridas.