Da nacionalização de Getúlio Vargas à polêmica privatização em 1997, conheça a história da Companhia Vale do Rio Doce.
A Vale, uma das maiores mineradoras do mundo, tem suas origens ligadas a disputas pelo minério de ferro de Itabira (MG) e à visão nacionalista de Getúlio Vargas. Criada como estatal em 1942, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) cresceu exponencialmente, tornou-se líder global e, em 1997, teve seu controle vendido em um leilão controverso, marcando a história econômica do Brasil.
No início do século 20, a Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM) começou a operar, transportando produtos agropecuários e minério de ferro. A cidade mineira de Itabira tornou-se um ponto crucial em 1908. A notícia da riqueza mineral da região atraiu um grupo inglês (Brasília Iron Syndicate – BIS), que em 1911 criou a Itabira Iron Ore Company (IIOC). A IIOC adquiriu o monopólio das jazidas locais e o controle da EFVM, com o objetivo de exportar o minério pelo Porto de Vitória (ES), embora uma contrapartida exigida pelo governo – a construção de uma siderúrgica – nunca tenha se concretizado.
Em 1919, o controle da IIOC ou para o americano Percival Farquhar. Seus planos de exportação, no entanto, esbarraram na oposição de Arthur Bernardes, então governador de Minas e posteriormente presidente do Brasil (1922). Bernardes defendia o desenvolvimento de uma indústria siderúrgica local e era contra a exportação do minério bruto, impondo pesadas multas que inviabilizaram os planos de Farquhar.
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Getúlio Vargas: nacionalização e a criação da CVRD em 1942
O cenário mudou com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, após a Revolução de 1930. Vargas governou por decretos-lei e defendeu a nacionalização das riquezas minerais do país. A pressão sobre as concessões estrangeiras aumentou, especialmente sobre a IIOC, que não cumprira a promessa da siderúrgica. Durante o Estado Novo, em 1939, a IIOC perdeu suas concessões.
Com a Segunda Guerra Mundial em curso, o minério de ferro brasileiro tornou-se estratégico. Em 1942, através dos Acordos de Washington, firmados com o apoio dos Estados Unidos e Reino Unido (interessados no minério para a indústria bélica), as jazidas de Itabira foram transferidas de volta ao governo brasileiro. Nesse contexto, em junho de 1942, Getúlio Vargas, por meio de decreto-lei, criou a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). Constituída como sociedade de economia mista, a CVRD incorporou os ativos da antiga IIOC e da EFVM, garantindo o controle estatal sobre a exploração e exportação do minério.
Expansão estatal: A CVRD rumo à liderança global (Pós – Getúlio Vargas a 90s)
Após sua criação, a CVRD iniciou uma trajetória de crescimento. Começou abastecendo pequenas siderúrgicas nacionais (1947) e diversificou seus clientes internacionais para além dos EUA, conquistando mercados na Europa Ocidental e Oriental (1954) e no Japão (1955). Em 1956, abriu seu capital na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.
Nos anos 60, sob a presidência de Eliezer Batista, a CVRD implementou inovações como o conceito de “distância econômica”, utilizando navios de grande porte para transportar minério ao Japão e petróleo na volta, otimizando custos. Batista iniciou a construção do Porto de Tubarão (Vitória, inaugurado em 66), que fortaleceu laços com clientes japoneses e alemães através de contratos de longo prazo.
No final dos anos 60, foram descobertas as vastas reservas de Carajás, no Pará. A Vale obteve a concessão para construir a Estrada de Ferro Carajás (EFC) em 1976 e, em 1977, já era a maior exportadora mundial de minério de ferro. Eliezer Batista retornou em 1979 para implementar o Projeto Ferro Carajás, que, apesar das dificuldades da “década perdida” dos anos 80, foi inaugurado em 1985, consolidando o Sistema Norte (Mina-Ferrovia-Porto de Ponta da Madeira/MA).
A privatização conturbada de 1997
Nos anos 90, a CVRD era a principal exportadora do Brasil e líder global no mercado de minério de ferro. Contudo, em 6 de maio de 1997, em meio a uma acirrada batalha judicial que chegou a ter um oficial de justiça tentando suspender o pregão com uma liminar, o governo federal vendeu sua participação de 41,7% na companhia por R$ 3,3 bilhões. O leilão foi vencido por um consórcio liderado pela Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). A privatização ocorreu em um momento de lucratividade crescente para a empresa.
Vale pós-privatização
Após a privatização, a empresa continuou sua expansão. Lançou ações nas bolsas de Nova York (2002) e Madrid (2003), diversificou suas operações para cobre (Mina do Sossego, 2004) e níquel/metais base com a aquisição da canadense Inco em 2006 (agora Vale Canada / Metais para Transição Energética). Em 2007, a CVRD mudou oficialmente seu nome para Vale, facilitando o reconhecimento internacional.
Entretanto, a história recente foi marcada por tragédias. Em 2015, o rompimento da barragem da Samarco (t venture da Vale com a BHP) em Mariana (MG) causou um desastre ambiental e social de grandes proporções. Em 2019, um desastre ainda pior ocorreu com o colapso da barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG), que resultou na morte de 270 pessoas e devastou a região. A Vale firmou um acordo bilionário (R$ 37,6 bilhões) para reparação dos danos de Brumadinho e se comprometeu a descomissionar todas as suas barragens a montante (mesmo tipo da que rompeu) até 2030, um processo custoso. O caso Samarco ainda tramita na justiça.
Atualmente (Maio de 2025), a Vale é uma “corporation” com controle acionário pulverizado. A influência do governo federal é indireta, exercida principalmente pelo fundo de pensão Previ (funcionários do Banco do Brasil), após a saída do BNDES do quadro acionário em 2021. Em 2022, a empresa registrou receita líquida de R$ 226 bilhões e lucro líquido de R$ 96 bilhões, mantendo operações globais e empregando mais de 200 mil pessoas.
Eu não conhecia essa história.
Muito interessante saber que Getúlio Vargas foi um ponto de partida para essa melhoria brasileira.
Imagino se tivesse ficado na mão do governo **** como de hj, ela já teria falido