Com capacidade para operar 120 dias sem reabastecimento e perfurar a mais de 11.000 metros de profundidade, navio Meng Xiang lidera ambição chinesa de alcançar o limite entre a crosta e o manto terrestre
A China deu um o monumental em suas ambições científicas e geopolíticas ao comissionar o Meng Xiang (“Sonho”), seu primeiro navio de perfuração oceânica desenvolvido inteiramente no país, projetado para atravessar a crosta terrestre e atingir a misteriosa Descontinuidade de Moho. A embarcação irá operar no Mar do Sul da China a partir de 2025, com missões previstas até 2035.
Segundo a New Atlas e agência Xinhua, o projeto faz parte de um programa multidisciplinar que envolve pesquisa geológica, exploração de combustíveis subterrâneos e avanços em tecnologias navais, posicionando o Meng Xiang como uma das embarcações científicas mais avançadas do mundo.
A nova corrida ao centro da Terra
Inspirado pelo antigo Project Moho dos EUA (1958), o navio chinês visa atingir a camada que separa a crosta do manto terrestre: a Descontinuidade de Mohorovičić, ou simplesmente Moho. Essa fronteira, localizada a 5–10 km sob o leito oceânico, marca a transição entre rochas mais leves da crosta e rochas ultramáficas do manto, sob condições de temperatura e pressão extremas.
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Até hoje, nenhuma tentativa de alcançar fisicamente essa fronteira teve sucesso. O projeto soviético Kola Superdeep Borehole (1979) chegou a 12 km de profundidade, mas através da crosta continental, sem chegar ao Moho.
O Meng Xiang, com sua plataforma de perfuração marinha, pretende chegar a profundidades superiores a 11.000 metros, enfrentando pressões de até 2.000 atmosferas e temperaturas de até 300 °C.
Além disso, a embarcação possui um sistema automatizado de armazenamento de amostras e laboratórios especializados em geologia, microbiologia, oceanografia e mineração.
O objetivo é coletar amostras diretas da crosta inferior e iniciar experimentos que ajudem a decifrar processos térmicos, tectônicos e metamórficos fundamentais.
Os cientistas também esperam encontrar hidratos de gás natural, conhecidos como “gelo inflamável”, com potencial energético altíssimo.
Além do componente científico, o projeto carrega um peso simbólico de exploração e soberania tecnológica, traçando paralelos com missões espaciais.
Potência tecnológica e projeção global
Com 180 metros de comprimento e 33 metros de largura, o Meng Xiang desloca mais de 42.000 toneladas e abriga 180 tripulantes. Seu alcance é de 27.780 km e ele pode operar sem reabastecimento por até 120 dias.
A embarcação incorpora tecnologias de posicionamento dinâmico, sistemas de reciclagem de lama de perfuração e resistência a condições de mar extremo até o nível de um tufão força 12.
Diferente de outras plataformas, ele foi construído com foco multidisciplinar: ciência, energia, exploração mineral, e soberania geopolítica.
A China pretende usar o navio não apenas para pesquisa geológica, mas também para explorar jazidas de petróleo e gás em profundidades oceânicas extremas.
A embarcação também servirá como base para desenvolvimentos futuros em mineração de solo marinho e biotecnologia.
Com laboratórios embarcados, o Meng Xiang pode analisar em tempo real as propriedades dos materiais perfurados, reduzindo a dependência de laboratórios em terra.
Sua construção e comissionamento simbolizam a entrada definitiva da China na elite da exploração submarina global.
Controvérsias e interesses estratégicos
Apesar de promover colaboração internacional, a operação do Meng Xiang na região do Mar do Sul da China é vista com suspeita por vários países.
A China tem um histórico de tensões territoriais com Vietnã, Filipinas, Malásia e Brunei na região, que é rica em recursos e geologicamente complexa.
Em 2014, a plataforma Hai Yang Shi You 981 foi acusada de invadir águas vietnamitas, gerando protestos diplomáticos intensos.
A presença do Meng Xiang pode ser percebida como mais um movimento de reforço da presença chinesa em águas disputadas.
A embarcação também levanta preocupações ambientais, devido à sensibilidade dos ecossistemas marinhos profundos.
Além disso, há temor de que a pesquisa científica seja usada como cortina de fumaça para operações de espionagem e prospecção estratégica.
Países rivais podem monitorar o Meng Xiang com navios “observadores” que atuam em missões de contrainteligência e diplomacia silenciosa.
Assim, o navio simboliza não apenas um avanço tecnológico, mas uma nova camada de complexidade geopolítica e ambiental.