Cientistas estudam o concreto romano, que cura rachaduras sozinho e resiste à água do mar há mais de 2.000 anos. Entenda por que a engenharia moderna ainda não conseguiu reproduzir essa tecnologia milenar.
Em um mundo onde pontes colapsam, viadutos se deterioram e construções exigem reformas constantes, uma pergunta persiste entre engenheiros e arqueólogos: como as estruturas romanas sobreviveram por mais de dois milênios, muitas delas expostas à água do mar, sem ruir? A resposta está em um material que parece comum, mas esconde propriedades extraordinárias: o concreto romano. Utilizado em obras como o Panteão de Roma e os portos do Mar Mediterrâneo, esse composto antigo é mais resistente do que o concreto moderno e, surpreendentemente, possui a capacidade de se “curar” sozinho ao longo do tempo.
Hoje, pesquisadores do MIT, da Universidade de Utah e de centros europeus tentam desvendar os segredos desse concreto que, mesmo após séculos submerso, mantém sua integridade — algo que o concreto atual não consegue replicar.
O que é o concreto romano?
O concreto romano, também conhecido como opus caementicium, foi utilizado extensivamente a partir do século I a.C. pelos engenheiros do Império Romano. A composição básica incluía:
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- Pozolana (cinzas vulcânicas finas oriundas da região de Pozzuoli, perto de Nápoles);
- Cal viva (óxido de cálcio);
- Fragmentos de pedra, tijolos e cerâmica;
- E, no caso de construções marítimas, a presença da água do mar no processo de mistura.
A interação entre esses materiais, especialmente a reação química entre a cal e a pozzolana, formava um material que continuava a se fortalecer ao longo dos anos, diferente do concreto moderno, que tende a enfraquecer após décadas.
Por que o concreto romano é mais durável?
A principal diferença entre o concreto moderno e o romano está em como os materiais se comportam ao longo do tempo. Enquanto o concreto atual é feito com cimento Portland, que endurece rapidamente mas sofre com rachaduras e infiltrações, o concreto romano amadurece com o tempo — especialmente em contato com água.
Estudos recentes identificaram a formação de cristais de tobermorita aluminosa e phillipsita dentro da matriz do concreto romano. Esses minerais, praticamente inexistentes no cimento moderno, surgem naturalmente com o ar dos anos e preenchem fissuras internas, agindo como um sistema de autocura mineral.
Além disso, ao contrário do cimento Portland, o concreto romano resiste à corrosão em ambientes salinos, o que explica a longevidade de estruturas como os cais do porto de Césarea, que permanecem de pé após dois milênios submersos.
Concreto que cura rachaduras sozinho? Sim, os romanos fizeram isso
A ideia de um material que “se cura sozinho” pode parecer moderna, mas está presente no concreto romano há séculos. Em 2023, um estudo do MIT publicado na Science Advances confirmou que a presença de cal viva (e não apenas cal hidratada) na mistura romana desempenha um papel fundamental nesse processo.
Essas partículas de cal viva, chamadas de “fragmentos de cal”, não estavam completamente dissolvidas. Com o tempo, à medida que microfissuras surgiam no concreto e a água entrava, essas partículas reagiam rapidamente com a umidade, formando novos cristais de carbonato de cálcio que selavam as rachaduras de forma natural.
Esse processo de autocura, sem qualquer intervenção externa, é um dos maiores diferenciais do concreto romano. E, até hoje, nenhum concreto moderno possui essa capacidade de forma espontânea e duradoura.
A engenharia moderna tentou copiar — e ainda não conseguiu
Desde que os cientistas começaram a estudar o concreto romano em profundidade, diversas tentativas foram feitas para reproduzi-lo em laboratório. Mas, mesmo com toda a tecnologia disponível, a fórmula exata e o comportamento a longo prazo continuam sendo um mistério parcialmente resolvido.
Alguns dos principais desafios:
- Reproduzir a pozzolana original, que é rica em alumínio e silício, e não está disponível em larga escala fora da Itália;
- Controlar a proporção ideal de cal viva não hidratada, que precisa ser inserida sem comprometer a resistência inicial do material;
- Simular as condições naturais de maturação em contato com água do mar, que ocorrem ao longo de décadas.
Mesmo assim, projetos de pesquisa financiados por universidades e até pela marinha dos EUA vêm explorando versões adaptadas do concreto que cura rachaduras sozinho, inspirado no modelo romano.
Aplicações modernas: da construção civil ao combate à corrosão marinha
O potencial de adaptação do concreto romano moderno vai muito além da arqueologia experimental. Se sua fórmula puder ser reproduzida com sucesso, ele poderá ser usado em:
- Portos, plataformas marítimas e quebra-mares, onde a corrosão por água salgada é um problema constante;
- Barragens e túneis, que exigem resistência a longo prazo e difícil manutenção;
- Construções em regiões sísmicas, onde microfissuras são inevitáveis, mas podem ser autocorrigidas;
- Infraestrutura urbana crítica, como pontes e viadutos, prolongando sua vida útil e reduzindo custos de reparo.
Além disso, a redução na emissão de CO₂ associada à produção de cal em vez de cimento Portland torna esse concreto ambientalmente mais sustentável.
Estruturas que desafiam o tempo: exemplos do concreto romano em ação
Vários monumentos da Roma Antiga permanecem de pé hoje graças ao concreto romano. Entre os mais impressionantes estão:
- O Panteão de Roma, com sua cúpula de 43 metros de diâmetro feita inteiramente de concreto sem armadura metálica;
- A Via Appia, com seções de base construídas com camadas de concreto há mais de dois mil anos;
- O Porto de Césarea (atualmente em Israel), construído por Herodes com concreto hidráulico romano, ainda visível sob o mar;
- Os aquedutos romanos, muitos dos quais foram mantidos funcionais até o século XX.
Essas obras comprovam que o concreto que resiste ao mar por 2 mil anos não é mito, mas uma realidade arqueológica e científica.
Concreto moderno: por que dura tão pouco?
O concreto moderno é eficiente, mas tem limitações. Com base em cimento Portland, ele é rápido para construir, barato e fácil de moldar. No entanto, tem uma vida útil estimada entre 50 e 100 anos, muito inferior ao concreto romano.
Seus principais problemas são:
- Sensibilidade à água e variações térmicas, que geram rachaduras;
- Corrosão da armadura metálica, especialmente em ambientes costeiros;
- Incapacidade de regeneração natural, exigindo manutenção contínua;
- Alta pegada de carbono: a produção de cimento responde por cerca de 8% das emissões globais de CO₂.
É por isso que engenheiros e ambientalistas buscam alternativas inspiradas nos romanos, unindo durabilidade e sustentabilidade.
O que a ciência aprendeu com os romanos até agora
As pesquisas dos últimos 20 anos revelaram que os romanos tinham um domínio empírico notável sobre química de materiais — mesmo sem compreender os processos em nível molecular.
Descobertas fundamentais incluem:
A interação entre pozzolana e cal viva, responsável pela formação de minerais que selam fissuras;
O uso de pozzolanas ricas em sílica e alumínio, que promovem maior estabilidade química;
O processo de autocura mineral induzido por água, que aumenta com o tempo em vez de diminuir.
Esses dados estão agora sendo usados por startups e institutos de engenharia para criar novos tipos de concreto de ultra-alta durabilidade, inclusive com inteligência artificial aplicada na previsão de fissuras.
O concreto romano é mais do que um vestígio arqueológico: é uma lição de engenharia atemporal. Ele cura suas próprias rachaduras, resiste à ação do mar por milênios e ainda desafia a engenharia moderna, mesmo em pleno século XXI.
Entender e reaplicar esses princípios pode ser essencial para o futuro das construções — especialmente num mundo que exige infraestrutura resiliente, sustentável e de longa duração.
Afinal, se os romanos conseguiram construir monumentos que atravessaram os séculos, por que ainda estamos reféns de materiais que mal duram um século?
Se os romanos já faziam concreto que dura 2 mil anos, por que o nosso ainda racha em menos de 50?
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